Página Branca - Dezembro




Corro atrás de Correntes

Tudo se passou naquele dia, na areia. Em que estava algemado às rochas e os olhos tinha-os fechados por causa do frio, e do sal do mar. A praia estava vazia, branca do gelo, e escura por causa do mar. “Um dia vou pensar em pôr-me de pé e ir nadar. Pode ser que passe alguém, e me cumprimente como se fosse gente”. Mas o escuro não me fala a mim, nem respira. Não faz mais nada, se não fazer-me companhia. Se calhar lá no fundo do mar, sabes? Se calhar lá é mais tranquilo, mais calmo. Pode ser que um dia alguém passe por cá e me dê umas festas na cabeça.

Mas não. Não sou ninguém, não sou nada, nunca fui! Corro atrás de correntes, é verdade. Que infiel que sou! Digo isso a mim mesmo e ainda assim, vejo-me quieto, imóvel, parado e preso neste rochedo com a fuça carrancuda. “Que pobre coitado” pensam os limos e as conchas, aqueles que me notam, se é que pensam alguma coisa, se é que me notam sequer... Que olhavam a chuva e a neve que caíam por ali? Que não fosse paixão ou que não seja o fim?!

Será que foi o que quis dizer? Ou que quero correr atrás de marés. Ou que talvez tenho cobiça do oceano também, que nunca cai nem tropeça nem finge que é outra coisa que não ele mesmo. Por poder sentar-se, continuar atado pelos pulsos e arrastar essas prisões para onde vai.
Corro atrás de correntes, corro… mas estou amarrado, ainda, para poder dizer que saí ao mundo com vontade de ser visto. De ser visto pelas brisas que passam por mim e não dizem nada. Cheio de tudo e de nada, eu ainda não me mexi, nem sofri, nem mudei, nem deixei de correr.

Corro atrás de correntes, não corro atrás de marés!  

André Crispim



2 comentários:

LastLombax disse...

Oh pa, tu devias ser escritor!

Anónimo disse...

Continua a correr. E a escrever...

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