[Análise] Assassin's Creed 3



ANÁLISES


















A franquia Assassin’s Creed é das mais emblemáticas séries da atual geração. O seu primeiro jogo foi lançado em 2007 e consigo trouxe a cativante história da luta eterna entre os assassinos e os templários. A sequela foi uma revolução. Expandiu e em muito o gameplay, localizando a história numa Itália renascentista. Trouxe também consigo uma das personagens mais emblemáticas dos últimos dez anos. Falo, claro está, de Ezio.

Depois de Assassin’s Creed II, que obteve sucesso quer a nível da crítica, quer a nível financeiro, e do lançamento de duas sequelas diretas que seriam acusadas de pouca inovação, pedia-se que Assassin’s Creed III fosse realmente uma sequela e não apenas mais um jogo idêntico aos anteriores. E isto foi o que a Ubisoft prometeu. Com implementações novas como a possibilidade de se caçar animais selvagens à la Red Dead Redemption e batalhas navais, vinha também a esperança dos jogadores que Assassin’s Creed III pudesse ser o melhor jogo da série até agora.

Veredicto

Como é habitual na série, Assassin’s Creed III tem, na prática, duas histórias diferentes mas conectadas entre si. O enredo que liga todos os jogos é o de Desmond Miles, que se encontra em 2012. Encontramos Desmond numa tentativa de salvar o mundo de uma atividade solar que traria o caos e a destruição. Para isso, tem de atravessar um templo construído pela civilização primordial, que existiu antes dos próprios humanos. Pela primeira vez na série, senti que o enredo de Desmond significava alguma coisa e que tinha algum espaço no plano geral. As suas missões, que serão alternadas entre os capítulos da história do seu antepassado, têm significado e são divertidas, e oferecem uma grande variedade estética ao que é habitual do século XVIII.

Depois temos o enredo do antepassado de Desmond, Ratonhnhaké:ton, mais conhecido pelo nome Connor. Sem querer dar demasiada informação sobre a história, as horas iniciais de Assassin’s Creed III nem sequer são jogadas na pele de Connor. Para dizer a verdade, este é um jogo que demora bastante a começar, e tudo em nome de transmitir uma enorme reviravolta na trama inicial do jogo. Fãs da série muito provavelmente conseguirão sentir o que vai acontecer muito antes, e esta reviravolta custará cerca de hora e meia de gameplay, e só depois é que o enredo de Connor começa, e com ele, a melhor parte do gameplay. O protagonista é-nos apresentado na sua aldeia natal. Ratonhnhaké:ton é o seu nome de nascença, e se têm dificuldades em pronunciá-lo é porque é um nome índio.

Nascido numa América do norte pré-revolucionária, Connor é, quando nos é apresentado, um pequeno rapazinho índio. Tudo corre normalmente, até que um grande incêndio invade a sua aldeia e leva consigo a sua mãe. O resto do jogo é passado na busca de Connor de vingança pelos causadores do incêndio e também em proteger o que resta da sua aldeia de ataques vindouros. E é por isto que ele se torna um assassino, para matar os responsáveis pela morte da sua progenitora e a iminente destruição da sua terra natal, até porque os culpados de tudo isto são templários. Isto é, até meio do jogo, em que a atenção se foca na revolução americana, e na luta dos colonos por uma América livre do controlo britânico. Este mudar de atenção de Connor fica mal explicado, e para o fim da sua aventura, não se sabe muito bem afinal qual é o seu objetivo.

Quer as motivações quer o motivo porque Connor luta são confusos











A história é, portanto, confusa. Tem momentos de grande qualidade e inspiração e outros momentos completamente amadores, especialmente no que toca à transformação de Connor num assassino. Depois de uma personagem tão interessante como Ezio é pena ver uma personagem tão fastidiosa como Connor. A sua motivação é, como disse anteriormente, meia obscura. Para além disso, é uma personagem sem piada e por vezes sinto que seria necessário algum alívio cómico numa história que parece ser levada demasiada a sério. No entanto, há no jogo momentos realmente inspiradores.

Falo de instâncias em que se põe em causa se afinal os templários são uma ordem tão maléfica como é retratada noutros jogos. Se afinal o objetivo de ambos, templários e assassinos não é o mesmo, apenas o método para lá chegar é divergente. Momentos em que se põe em causa a justiça de uma revolução que fala tanto em liberdade enquanto se esquece de práticas contraditórias como a escravatura. E já na secção de Desmond, onde as conversas com Shaun, que é britânico, põe totalmente de parte que este jogo seja chauvinista para o lado americano e servem como um bom contra-peso para as partes mais nacionalistas.

A atenção ao detalhe também é contínua brilhante. Voltam os textos ingame sobre um pouco de tudo. Edificios, acontecimentos, personagens, etc… Alguma da diversão que a história poderá transmitir será proporcional à quantidade de conhecimento do jogador da Guerra de Independência dos EUA. É impressionante ver todas as grandes figuras que arquitectaram a revolução dos Estados Unidos da América, assim como presenciar os grandes acontecimentos, como a formulação da declaração de independência e a batalha de Lexington e Concord. 

George Washington é uma das figuras históricas que Connor encontrará na sua demanda




Presenciar, porque uma das maiores desilusões que tive ao jogar Assassin’s Creed foram as batalhas. Se num dos trailers era possível ver uma cinemática onde Connor defrontava os inimigos de forma direta, matando tudo e todos até chegar ao seu alvo a verdade é que, no que toca ao gameplay, a história é bastante diferente. É possível ver as batalhas, mas nunca há a sensação que fazemos verdadeiramente parte delas. Isto porque sempre que há um confronto bélico, o objetivo de Connor é assassinar um general que se encontra atrás das linhas dos inimigos, e em vez de enfrentarmos os soldados todos, teremos de flanquear a disputa sem sermos detetados até conseguirmos assassinar o alvo pretendido. Isto tudo em sequências onde é tirada muita liberdade ao jogador. Aliás, há muitas secções do jogo em que é tirada liberdade ao jogador, e em que temos de seguir o guião e fazer o que o jogo quer, não o que queremos. Para um jogo de mundo aberto, Assassin's Creed III pode parecer por vezes incrivelmente linear.

Falemos então agora das novas adições, começando pela caça. Esta é uma distração muito interessante e é uma adição bem-vinda. Na região Frontier, ou em português, Fronteira, é possível caçar animais que vão desde pequenos coelhos a ursos, passando por veados e lobos. A variedade de animais não é gigantesca, mas é a suficiente para intrigar o jogador sobre qual será o próximo animal a aparecer. Para caçar, Connor pode-se esconder em ervas altas e esperar que a presa se aproxime, pode montar armadilhas e utilizar engodo, combinando as diferentes técnicas a seu bel-prazer.

As armadilhas são só uma das ferramentas ao nosso dispor para caçar




Matar a nossa presa é gratificante quando corre tudo de acordo com o plano. O problema acontece quando os animais detetam o jogador antes de a caçada terminar. Se alguns simplesmente fogem, outros, como os animais carnívoros atacam Connor obrigando o jogador a realizar um quick time event. É irritante, porque numa caçada furtiva os despojos têm a mesma qualidade se se matar um urso através de um quick time event, estando a recompensa apenas condicionada pela arma utilizada. Entendo que estes foram usados para trazer ao jogador uma sensação de perigo, mas pergunto-me se não seria muito mais interessante obrigar o jogador a fugir porque fez asneira? Estou certo que tornaria a caça muito mais gratificante e tensa. Quanto à recompensa, os espólios da caçada rendem bastante dinheiro.

Como disse anteriormente, podemos matar as nossas presas se subirmos a árvores, e em secções do mapa como a Fronteira, é possível fazer free run nelas. Este é fluido e muito espetacular, quando funciona. Glitches ocasionais ou pequenos erros ou más leituras da parte do jogo do que o jogador quer fazer podem trazer frustrações momentâneas. O que não é momentâneo é a sensação de que o controlo sobre Connor quando corre nas árvores é pouco. A corrida é efetuada apenas carregando no R1 (na Playstation 3, versão que testei) e empurrando o analógico esquerdo para a frente, sendo que apenas o controlo da câmara é utilizado para fazer Connor virar. A super-simplificação do free run fez com que nestas alturas parecesse que o jogo se estava a jogar sozinho.

Os confrontos navais são das melhores secções do jogo
As batalhas navais parecem um jogo totalmente novo dentro de si (normal, tendo em conta que foram produzidas por um estúdio à parte), e são a minha adição favorita, ao ponto que gostava de ver a Ubisoft tornar isto um jogo por si só, expandindo o conceito. Tinha medo de como se traduziria a luta naval num comando mas o gameplay é espetacular e cativante. Temos à nossa disposição dois tipos de ataque. Um mais explosivo e com uma área de impacto maior utilizado para fragatas, e outro mais concentrado para navios mais pequenos.

Tendo em conta que a navegação é rápida e desafiante, muitas das lutas podem-se tornar frenéticas, com a tripulação a aplaudir cada tiro certeiro e gritando de agonia a cada dano sofrido. Podemos até abordar os outros navios, lutando no seu interior contra as suas forças, criando assim um caos enorme que é visualmente espetacular. E esta é a secção da campanha a solo que mais desafio trará ao jogador, mas também a mais recompensadora. 

Outras implementações como armas novas são interessantes, se por vezes inúteis. Por muito espetacular que seja o rope dart, raramente o utilizei para além das vezes requeridas pela história. Para além do machado caraterístico de Connor que é espetacular de usar, acho que a melhor adição foi mesmo o arco, que é uma opção mais furtiva que a pistola.

Temos ainda um sistema de crafting bastante extenso. Poderemos completar missões secundárias onde seremos recompensados com trabalhadores para a cidade onde Connor tem a sua “base”, um pouco como Monteriggioni em jogos anteriores. Estes trabalhadores e artesãos serão utilizados para fabricar um pouco de tudo, desde barris a armas e armaduras, que depois poderão ser utilizados por Connor ou vendidos. Esta feature é extensiva e seria muito melhor se o dinheiro pouco importasse no jogo. É possível acabar o jogo apenas com as armas iniciais, sendo que as diferenças entre as armas dentro da mesma classe parecem muitas das vezes simplesmente cosméticas.

Os combates, apesar de divertidos, são fáceis
Isto porque o combate, apesar de diferente, continua fácil como tudo. Goste-se ou não, isto torna as lutas fáceis e por vezes é ridículo podermos matar dez guardas seguidos sem qualquer interferência dos outros que se encontram no combate, por vezes parece que apenas à espera de morrer. Isto no entanto transmite uma sensação de capacidade sobre-humana por parte de Connor, o que é super divertido.

Quanto a missões secundárias, há um misto de missões interessantes e outras simplesmente secantes. Missões de entrega de cartas e de recolha de “bugigangas” são algo aborrecidas e sem qualquer interesse. No entanto também há fortes para se tomar, onde se pode jogar de modo furtivo ou o mais barulhento possível, e são uma adição muito interessante.

Também as missões para se recrutar assassinos para a guild de Connor foram remodeladas, e tornadas muito mais agradáveis do que as de Brotherhood. Desta vez é possível ter menos ajudantes, o que pode parecer mau à primeira vista, mas é o que faz com que cada assassino seja uma personagem que interessa e não um cidadão sem nome que se juntou à irmandade. Para se recrutar não basta salvá-los de uma situação apertada, é primeiro preciso libertar do domínio dos templários a zona do assassino em questão, através de pequenas missões cativantes como salvar prisioneiros e defender agricultores de ataques dos guardas ou outras algo chatas como queimar colchões contaminados com a peste e matar cães com raiva.

É fácil entender por tudo o que disse anteriormente uma coisa: o jogo é gigante. Para além de todo o conteúdo, para se sincronizar por completo (sincronizar em linguagem do jogo significa completar) uma missão tem de se efetuar certas ações, como não ser detetado ou matar certo número de inimigos de certa maneira, o que pode fazer alguns dos jogadores re-jogar algumas missões várias vezes. Pode nem sempre ter uma qualidade consistente no que toca ao conteúdo, mas se querem um jogo que vos ocupará por muitas horas, dentro do género Assassin’s Creed III é das escolhas mais acertadas. Para terem uma ideia, quando acabei o jogo, fazendo muitas missões secundárias, tinha cerca de 50% do jogo terminado e já ia com 15 horas de jogo, o que quase duplicaram quando estive a fazer o resto das missões secundárias, e podem certamente triplicar nestas semanas em que vou continuar entretido com o multiplayer.

Os visuais são bonitos, coloridos e impressionantes
Visualmente o jogo é um mimo. O cenário é bastante diferenciado e há secções graficamente memoráveis. As diferenças climáticas também são espantosas, desde a neve até à chuva, passando pelo nevoeiro e pelo tempo nublado. As cidades são diferentes, neste caso, Nova Iorque e Boston, a primeira com as suas partes destruídas pelo incêndio, a segunda com os seus portos e locais mais rurais, e claro que a Fronteira é também diferente, com as suas cidadezinhas dispersas e a enorme área selvagem.

O jogo está, no entanto, minado por um montão de glitches e pequenos bugs. Apesar de estes raramente interferirem com o gameplay, não deixam de tirar o jogador da experiência e quebrar alguma ilusão.

No que toca ao som, a sonoplastia está interessante. Quer no mar, onde podemos ouvir os gritos da tripulação, quer em terra, onde podemos ouvir as pessoas a vender produtos e a fazer a sua vida normal. A música é muitas das vezes pouco memorável, à exceção de talvez uma ou outra faixa mais inspiradora, mas é competente e complementa muito bem o gameplay.

Mas a campanha a solo de Assassin’s Creed III é só uma das componentes do jogo. A outra é um multiplayer de qualidade inegável. Vem completo com tutoriais e treino extensivo para aqueles que o jogam pela primeira vez e oferece uma experiência única que é impossível de encontrar noutros jogos. Aliás, atrevo-me a dizer, que as batalhas navais e o multiplayer são as melhores partes de Assassin’s Creed III.

Tem consigo tudo o que seria de esperar num multiplayer atual. Progressão do jogador, centenas de desbloqueáveis, quer de customização meramente visual, quer de perks e boosts que se podem usar durante o jogo. Também existem mais de doze modos no multiplayer. Desde os recorrentes deathmatch, domination, manhunt, e o novo modo cooperativo wolfpack, que é um derivação do modo survival de Gears of War, com o twist de em vez de se enfrentar dezenas de inimigos, tem de se matar alguns alvos  coordenadamente com os nossos colegas de equipa para se poder chegar à sequência seguinte.

O multiplayer é das melhores e mais divertidas partes de Assassin's Creed 3
É claro que a Ubisoft arranjou maneira de fazer dinheiro com o multiplayer, através de um sistema de microtransações. Tanto quanto sei, é possível desbloquear-se tudo sem recorrer a este sistema, mas não deixa de ser irritante que ele exista. Afinal, o jogador já deu mais de cinquenta euros pelo blu-ray. E digo cinquenta porque com o passe uplay, quem comprar o jogo em segunda mão terá de comprar o multiplayer à parte. Mais, a Ubisoft já está a vender um season pass, que dará direito a quem o adquirir, ter os mapas que serão lançados gratuitamente. Todos os outros, se desejarem, terão de os comprar.

Assassin’s Creed III tinha potencialidade para ser o melhor jogo deste ano. Diria até, o melhor jogo desta geração. É um jogo enorme, cheio de conteúdo, parte dele com uma qualidade fantástica, mas devo dizer que há pequenos pormenores que me fazem sentir que os devs do jogo cometeram erros algo amadores. Eventos na história que não fazem sentido, a lentidão do jogo a começar, inclusões no jogo que não têm qualquer utilidade, glitches e bugs e um final no enredo de Desmond muito fraco.

Supostamente este seria o jogo que se concluiria a história de Desmond, que acompanhamos há cinco jogos. Sem entrar muito no campo dos spoilers, no final, Desmond tem de efetuar uma escolha (da qual o jogador não tem qualquer controlo). E depois disso? Uma cutscene. Deixou um sabor algo amargo e foi talvez a gota de água num jogo com um oceano de problemas.

Apesar de alguns acessórios serem inúteis, o arco revelou-se uma boa adição



As diferenças entre as cidades são interessantes e nas consolas é o jogo de mundo aberto mais bonito do mercado. Têm também uma enorme atenção ao detalhe, com uma estética distintamente do século XVIII. Os modelos ingame estão fantásticos e as animações estão espetaculares. Só peca por estar assolado por pequenos glitches e bugs, que mesmo com o patch do dia de lançamento interferem na imersão do jogador.



Secções onde o jogador parece não ter controlo, adições de armas que pouca utilidade têm e a por vezes má leitura do que o jogador pretende, minam uma jogabilidade que apesar de fácil, é cativante. Nota mais do que positiva para as secções de batalha navais que são acompanhadas de uma jogabilidade fascinante e encantadora.



Sem ser memorável, a música é competente e faz o que lhe é pedido: complementar o gameplay. Já a sonoplastia é realista e ajuda a dar vida às cidades. O voice acting é excelente na maior parte das vezes, só parece algo insípido nas vozes faladas no dialeto índio.



Como disse anteriormente, há muitas horas de jogo pela frente. A juntar ao modo campanha, há um multiplayer que não encontrarão em mais lado nenhum. Só não é perfeito porque alguma das atividades  não têm qualquer interesse.




Assassin's Creed III é uma lufada de ar fresco para uma série que necessitava de mudar há muito tempo. Mas a mudança no setting e em algumas mecânicas não foi suficiente para esconder uma história com inconsistências gravíssimas, aliada a uma jogabilidade que transmite uma sensação de falta de controlo do jogador. Fãs da série terão muitas horas de diversão, se algo frustrada, mas para quem nunca jogou nenhum jogo da conhecida série da Ubisoft, podem ter problemas em entender o que atrai tanto louvor à franquia. Assassin’s Creed III é um bom jogo. Mas pedia-se algo mais à Ubisoft.




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